Incêndio no Marco Zero, em Londrina
Incêndio no Marco Zero, em Londrina | Foto: Micaela Orikasa

Um incêndio no Marco Zero marcou o inicio de agosto em Londrina. A fumaça e o cheiro de mata queimada trouxeram lembranças de frente pioneira de colonização.

“Chegamos... Onde?... No limite das terras da companhia...“ Esse diálogo teria ocorrido entre membros da “expedição pioneira” em 21 de agosto de 1929, nas proximidades do Marco Zero, segundo discurso oficial.

A história da colonização do Norte do Paraná é carregada de silêncios e flutuações.

Em Outubro de 1925, a Companhia de Terras Norte do Paraná adquire, do governo do Estado, 350.000 alqueires de “terras não alienáveis”, segundo decreto, e a concessão da Estrada de Ferro Central do Paraná. Ambas vinculadas à Companhia Marcondes de Colonização de São Paulo (1922). A ferrovia foi ajustada para a CTNP (1925). A Linha Tronco partia de Carambehy e seguia até a cabeceira do Pirapó. Linha tronco e quatro ramais contemplavam as terras adquiridas. Fazia parte do Plano de Viação do Governo (1925). (Yamaki, 2017).

O ramal 2 da EFCP ajustado era estratégico. Partia do rio Marrecas e seguia em direção às margens do Paranapanema. No caminho, atravessava as terras do engenheiro Francisco Beltrão. Terras recebidas como pagamento de trabalho para o governo em Palmas.

Um fato pouco conhecido. Em 1927, Beltrão havia finalizado a medição de suas terras e transfere para a CTNP uma faixa de três quilômetros. Tinha como eixo o ramal 2. Heimtal (1929) e Londrina (1934) foram implantadas obedecendo a esse eixo. Os limites atuais dessa faixa são: a Av. Angelina Vezozzo e a Av. Rio Branco. O ramal 2 é a atual Av. Duque de Caxias.

A CTNP, ao estender a concessão da CFSPP (1928) a partir de Cambará, desiste da EFCP ajustada. EFCP e a Cia Marcondes foram rapidamente esquecidas.

Em 1927, dois anos antes da “caravana pioneira”, uma expedição “em demanda das terras da CTNP”, foi organizada. Comandada por Antonio de Moraes, saiu de Jataí, seguiu o picadão, foi até a Fazenda Palhano e ao divisor de águas Pirapó Tibagi. (CTNP, 1977).

Finalmente, o “limite das terras da CTNP...” a que referiu Razgulaeff (1929). Era a divisa das terras anexadas de Beltrão. Local do projeto do Patrimônio Três Boccas.

Três Boccas seguia as linhas NSLO, tinha planta retangular de 500m x 750m, solo fértil, salubre, água em abundância, acesso à ferrovia e estrada de autos. Seguiu cláusulas do Decreto de Colonização (218/1907). Apresenta rua central onde foi instalado o Hotel e o Escritório da Companhia. É identificado na cartografia da época. Por exemplo, a Planta Geral da CFSPP (MacDonald & Gibbs, 1928-32) e a Planta da Colônia Heimtal (CTNP, 1929).

A importância de Três Boccas pode ser avaliada na Planta Geral da CFSPP (1928-32). MacDonald projeta duas estações muito próximas: uma em frente ao Patrimônio Três Boccas e outra em frente ao “Alto” onde Londrina seria implantada. Era próximo ao cruzamento das ferrovias EFCP e CFSPP.

Resgatei, em 2003, plantas em papel linho e aerofotos de 1949. Eram consideradas defasadas na época. É possível reconhecer nelas o Hotel e o Escritório da CTNP. Vinte e cinco anos depois (1974), uma outra aerofoto mostra um chão arrasado. Tudo havia sido derrubado para construir um conjunto habitacional.

Odisséia Rural. Hoje, quem passa pela Av. Theodoro Vitorelli pode identificar, logo depois do Marco Zero, um ponto de visão panorâmica. Avistar o vale do Patrimônio Três Boccas. É preciso saber interpretar. A partir dali, descer até o vale. Identificar um dos braços do ribeirão das Pedras. Ali, da rua Flor de Jesus poderá contemplar uma vista bucólica de chácaras, pastos e pomares. Para o Sul, a vegetação encobre a encosta. Para Oeste poderá observar o conjunto de edifícios do Centro. É o “Alto” identificado por MacDonald. Olhar pioneiro.

Preservar o caráter dessa paisagem cênica histórica. Desafio para Londrina 100 anos.

Humberto Yamaki, coordenador do Laboratório de Paisagem UEL

A opinião do autor não reflete, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina.

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