Após oito longos meses de isolamento social adotado para conter a pandemia do novo coronavírus, alguns músicos da cidade aos poucos estão conseguindo voltar a exercer seu ofício. O retorno aos palcos vem acontecendo de forma tímida em alguns bares que têm promovido apresentações com música ao vivo. Além do reencontro com o público, a retomada tem ajudado a amenizar a crise financeira enfrentada por muitos cantores e bandas que estavam impedidos de trabalhar presencialmente desde o mês de março.

Imagem ilustrativa da imagem Em Londrina, o show tem que continuar
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No Bar Valentino, as apresentações com música ao vivo voltaram a acontecer há apenas três semanas. Valdomiro Chammé, proprietário do estabelecimento e farmacêutico, destaca que para garantir a segurança do público tem seguido rigorosamente todos os protocolos estabelecidos pela prefeitura. “Pelo decreto, poderíamos receber até 50% da capacidade de público. Porém, estabelecemos um limite de reunir apenas 88 pessoas no salão maior, que tem capacidade para 300 e que possui um sistema de ar-condicionado capaz de renovar todo o ar que circula no ambiente até dez vezes por hora, pois foi projetado na época em que as pessoas ainda podiam fumar dentro do bar", esclarece.

Já na casinha de madeira que fica anexa ao salão principal do estabelecimento e que possui varanda e um espaço ao ar livre, Chammé informa que está recebendo até 90 pessoas no ambiente com capacidade para 180. O empresário enfatiza que além de disponibilizar álcool gel para o público e de ampliar o espaço entre as mesas, adotou outras medidas para evitar a aglomeração. “Concentramos os shows apenas na sexta, sábado e domingo e criamos uma lista de presença para evitar filas. Quando ocorre uma desistência, avisamos com 40 minutos de antecedência quem está na lista de espera”, diz.

Apesar dos cuidados adotados, o empresário comenta que o retorno do público está acontecendo aos poucos. “Depende muito do público do artista que vai se apresentar, os que têm público no grupo de risco costumam ter menos pessoas presentes na plateia. E, realmente, o ideal é que mais velhos fiquem em casa. Por isso não estamos fazendo divulgação em massa das apresentações ao vivo”, afirma.

O maior inconveniente citado por Chammé dentro do “novo normal” é em relação ao horário de fechamento dos bares, que devem encerrar as atividades às 22 horas. “O público chega às 20h30 e às 22 horas tem que ir embora. Acho que a prefeitura deveria autorizar o funcionamento dos bares pelo período de seis horas corridas, como acontece com o restante do comércio”, argumenta.

A opinião dele é compartilhada por Alinor Querubim - popularmente conhecido como Tuca -, que gerencia oito bares e restaurantes da cidade. “No Cheers Pub, por exemplo, a música ao vivo começava à meia-noite. Hoje temos que iniciar a apresentação às 20 horas. O público ainda não se habituou a chegar tão cedo e menos ainda com o fato de a apresentação ter que ser encerrada quando todos estão no auge da empolgação”, reclama ao destacar que todos os estabelecimentos administrados por ele também seguem todos os protocolos de segurança impostos pela prefeitura.

ENTRE O MEDO E O ENTUSIASMO

A ausência dos palcos que provocou a saudade do público também gerou dificuldades financeiras para muitos artistas. Mas enquanto alguns músicos estão ansiosos pelo retorno aos palcos, outros optaram por adiar o retorno profissional em nome da saúde. “No Pier Santa Mônica, promovemos rodas de samba todos os sábados que é quando servimos feijoada na hora do almoço. Porém, durante a pandemia os músicos mais idosos que já eram conhecidos do público não querem voltar a tocar enquanto a pandemia não acabar pois fazem parte do grupo de risco devido à idade avançada. Diante disso, tivemos que contratar músicos mais jovens para tocar na roda”, revela Alinor Querubim (Tuca), gerente do estabelecimento.

Silvia Borba: “Tenho muita saudade do público, mas confesso que só aceitei me apresentar presencialmente por se tratar de uma causa nobre”
Silvia Borba: “Tenho muita saudade do público, mas confesso que só aceitei me apresentar presencialmente por se tratar de uma causa nobre” | Foto: Divulgação

Apesar de não fazer parte do grupo de risco, a cantora Silvia Borba também optou por se afastar dos shows e das rodas de samba e choro das quais costumava participar. O isolamento social só foi quebrado esta semana para uma apresentação feita no Bar Valentino com renda revertida para a formatura dos alunos da Funcart (Fundação Cultura Artística de Londrina). “Tenho muita saudade do público, mas confesso que só aceitei me apresentar presencialmente por se tratar de uma causa nobre. Ainda tenho receio de me arriscar durante a pandemia”, afirma.

A adequação à realidade imposta pela pandemia de Covid-19 também tem exigido novas posturas por parte dos artistas. “A gente sabe que é um processo diferente, o público vai ter que ver o show sentado. Não pode se aglomerar na frente do palco. A gente gosta de ver todo mundo em pé pulando, dançando. A gente teve que adaptar algumas coisas para que o show funcione nesse novo formato, fazer novos arranjos", relata Élcio Oliveira, vocalista da banda Terra Celta, grupo que se apresenta no Bar Valentino neste sábado (14).

Élcio Oliveira, médico e músico: “Acredito que se existe uma lei liberando esse tipo de atividade é porque é seguro”
Élcio Oliveira, médico e músico: “Acredito que se existe uma lei liberando esse tipo de atividade é porque é seguro” | Foto: Marcos Zanutto/Arquivo Folha

Dividindo-se entre as profissões de médico e músico, Oliveira acha que é seguro para o público participar deste tipo de programa. “Acredito que se existe uma lei liberando esse tipo de atividade é porque é seguro. Mas essa é uma opinião mais pessoal do que opinião profissional como médico”, enfatiza.

Acostumada a frequentar bares que promovem apresentações ao vivo de música sertaneja, a estudante Mayra Ferri Gonçalves, 25 anos, voltou a frequentar este tipo de estabelecimento por considerar que o risco de contaminação existe em todos os lugares. “Não existe pandemia só nestes ambientes, ela está em todo lugar e em todo o mundo. Ninguém está seguro em lugar nenhum. Mas, temos que aprender a nos cuidar e, de forma cautelosa, dar continuidade em tudo na nossa vida, até mesmo no lazer”, afirma.