Em 1957, a cientista inglesa Kathleen Montagu fez uma descoberta que abriu novos rumos para a neurociência. Estudando o cérebro humano, encontrou uma molécula neurotransmissora que recebeu o nome de dopamina.

Em pouco tempo dezenas de cientistas que começaram a estudar sua descoberta encontraram coisas cada vez mais estranhas e complexas. Apenas 0,0005% das células cerebrais, por exemplo, produzem dopamina (uma em cada dois milhões de células). E apesar da pequena quantidade, elas são responsáveis por influenciar grande parte do comportamento humano provocando a sensação de prazer, satisfação e bem-estar.

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Alguns pesquisadores batizaram a dopamina de Molécula do Prazer, e o circuito que as células produtoras de dopamina percorrem no cérebro passou a ser chamado de Sistema de Recompensa. Para a sensação de prazer existir, necessariamente é preciso a ação da dopamina.

A psiquiatra norte-americana Anna Lembke foi uma das pesquisadoras que passou a estudar a dopamina com um foco específico: a função da dopamina nos vícios.

Em seu livro “Nação Dopamina” lançado pela editora Vestígio, escreve sobre como o entendimento da relação entre prazer e sofrimento se tornou essencial para a vida contemporânea: “Transformamos o mundo de um lugar de escassez em um mundo de imensa abundância: drogas, comida, notícias, jogos, sexo, compras, jogos de azar, mensagens de texto, imagens, redes sociais, mídias sociais... Os números crescentes, a grande variedade e o imenso potencial de estímulos altamente compensatórios são atordoantes. Os cientistas consideram a dopamina como uma espécie de moeda corrente universal para a avaliação do potencial adictivo (viciante) de qualquer experiência. Quanto mais dopamina no sistema de recompensa do cérebro, mais adictiva é a experiência.”

Em “Nação Dopamina”, Lembke aponta que junto à descoberta da dopamina, os neurocientistas também descobriram que “o prazer e o sofrimento são processados em regiões sobrepostas do cérebro e trabalham via um mecanismo de processo oponente – outra maneira de dizer isso é que o prazer e o sofrimento funcionam como uma balança”.

Através de exemplos clínicos de seus pacientes, Anna Lembke demonstra como os mais variados tipos de vícios contemporâneos se sustentam na balança sempre oscilando entre o prazer e o sofrimento. E que a solução para o consumo excessivo de prazer e de sofrimento estaria no equilíbrio da balança.

MOLÉCULA DO PRAZER

Para entender o papel da dopamina de maneira mais ampla é necessário recorrer a outro livro, “Dopamina - A Molécula do Prazer”, obra do psiquiatra Daniel Z. Lieberman e do escritor Michael E. Long lançada pela editora Sextante.

Exemplificando novas pesquisas, os autores afirmam que a dopamina não tem muito a ver com prazer, mas proporciona a origem de um sentimento mais potente: “Entender a dopamina é a chave para explicar e até mesmo prever o comportamento de uma série espetacular de ações humanas: criar literatura, música e artes visuais, buscar o sucesso, descobrir novos mundos e novas leis da natureza, pensar em Deus, se apaixonar.”

Daniel Z. Lieberman escreveu com Michael Long "Dopamina - A Molécula do Prazer" no qual   aborda a expectativa pela novidade
Daniel Z. Lieberman escreveu com Michael Long "Dopamina - A Molécula do Prazer" no qual aborda a expectativa pela novidade | Foto: Divulgação

Daniel Lieberman e Michael Long apontam para uma nova hipótese dos neurocientistas. A dopamina não seria apenas um sinal de prazer, de bem-estar ou de satisfação. Ela seria uma reação neurotransmissora ao inesperado, a uma possibilidade, a uma expectativa. A novidade seria o grande gatilho da dopamina, o prazer da novidade. E que, “do ponto de vista da dopamina, ter coisas não interessa – o que importa é consegui-las”.

Os autores apresentam estudos que indicam que os circuitos de dopamina não processam experiências do mundo real, apenas as possibilidades futuras: “A dopamina adora o erro de previsão de recompensa, que é a descoberta de que algo é melhor do que esperávamos. Paradoxalmente a dopamina faz tudo que pode para evitar essas previsões incorretas. O erro de previsão de recompensa é ótimo porque os circuitos de dopamina ficam empolgados com o surgimento de algo novo e inesperado, capaz de tornar a vida melhor. Mas ser surpreendido por um novo recurso inesperado significa que tal recurso não está sendo totalmente explorado. Assim, a dopamina atua para assegurar que a surpresa que foi tão boa nunca mais seja uma surpresa. Ela extingue seu próprio prazer. É frustrante, embora seja a melhor forma de nos manter vivos.”

Em “Dopamina – A Molécula do Prazer”, Lieberman e Long abordam a dopamina como não apenas um neurotransmissor restrito ao prazer imediato e propulsor de vícios, mas como elemento de sobrevivência: “Em condições normais, a ativação da dopamina no circuito do desejo desencadeia energia, entusiasmo e esperança. Na verdade, algumas pessoas passam a maior parte da vida perseguindo esse sentimento – um sentimento de expectativa agradável, de que a vida está prestes a melhorar.”

SERVIÇO

Imagem ilustrativa da imagem Dopamina: a molécula do prazer e de todos os vícios
| Foto: Divulgação

“Nação Dopamina – Por Que o Excesso de Prazer Está nos Deixando Infelizes e o Que Podemos Fazer Para Mudar”

Autora – Anna Lembke

Editora – Vestígio

Tradução – Elisa Nazarian

Páginas – 256

Quanto – R$ 64,90 (papel) e R$ 45,90 (e-book)

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Imagem ilustrativa da imagem Dopamina: a molécula do prazer e de todos os vícios
| Foto: Divulgação

“Dopamina – A Molécula do Prazer”

Autores – Daniel Z. Lieberman e Michael E. Long

Editora – Sextante

Tradução – Paulo Afonso

Páginas – 256

Quanto – R$ 59,90 (papel) e R$ 34,90 (e-book)