O Brasil emite, anualmente, cerca de 2,4 milhões de toneladas de carbono, segundo o Relatório do Observatório do Clima. Desse total, um quarto é resultado das atividades do agronegócio, metade é proveniente do desmatamento e os 25% restantes decorrem de todas as outras fontes emissoras, como resíduos e processos industriais. A quantidade de CO2 lançada na atmosfera pelo setor produtivo nacional ainda é muito alta e é inegável a necessidade de comprometimento dos produtores rurais na busca por práticas mais sustentáveis e que favoreçam o meio ambiente.

O país exerce protagonismo mundial na economia de baixo carbono, mas para alcançar as metas ambiciosas estabelecidas pelo governo ainda tem muito a avançar. Como um dos 195 signatários do Acordo de Paris, firmado durante a 21ª COP (Conferência das Partes) da UNFCCC, em 2015, o Brasil colocou como meta absoluta 1,32 GtCO2e (gigatonelada de CO2 equivalente) de emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2025, consistente com uma redução de 48,4% ante 2005. Em 2030, o objetivo é chegar a 1,20 GtCO2e e zerar as emissões até 2050, conforme descrito na NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) brasileira, ajustada no ano passado.

Até 2030, o governo brasileiro também tem como objetivo zerar o desmatamento. “Uma vez a gente zerando o desmatamento, o próximo grande desafio será na agricultura, mas a gente não precisa esperar até 2030”, disse o presidente da Câmara do AgroCarbono no Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), Eduardo Brito Bastos. Nesta segunda-feira (16), ele esteve em Londrina para participar da 5ª edição do Fórum do Agronegócio, promovido pela SRP (Sociedade Rural do Paraná). Neste ano, o evento teve como tema a “Resiliência: conexão agronegócio e natureza”.

No setor do agronegócio, um dos grandes desafios é promover a sustentabilidade ao mesmo tempo em que se aumenta a produção de alimentos. “A gente precisa produzir cerca de 300 milhões de toneladas a cada dez anos para alimentar a população do planeta Terra. O Brasil, em uma boa safra, produz 300 milhões de toneladas. A gente é um dos maiores produtores do mundo. Então, tem um desafio enorme para a sociedade que é como fazer isso sem impactar áreas novas, reduzindo ou, se possível, até parar o desmatamento”, destacou Bastos.

O principal caminho para manter a produção elevada sem prejudicar ainda mais o meio ambiente é a conversão de áreas de pastagem degradadas. “Muitas áreas foram convertidas para pastagens, tiveram um manejo ruim e a gente pode reconverter esses solos para a produção agrícola e, a partir disso, a gente reduz a pressão sobre o desmatamento, melhora a captura de carbono, melhora a saúde do solo e produz o alimento de que o mundo tanto precisa.”

O Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono) prevê o manejo mais adequado dessas áreas degradadas de forma a usar o carbono para ter acesso a um dinheiro mais barato. Por meio da Câmara do AgroCarbono, Bastos integra o Plano Nacional de Pastagens Degradadas, que prevê a recuperação de 40 milhões de hectares a um custo de R$ 600 bilhões. “Uma parte desse dinheiro vai vir de dentro do país. A gente já tem alguns financiadores, como o sistema bancário, mas boa parte dos recursos virá de fora, de países comprometidos com essa agenda, seja pelo lado da segurança alimentar, como boa parte dos países asiáticos, seja pela agenda de carbono e desmatamento, como boa parte dos países da Europa.”

Além dos recursos financeiros, é necessária uma mudança cultural dos produtores rurais. Para isso, o trabalho dos profissionais de extensão rural é fundamental para levar as melhores práticas ao campo, estimulando que as técnicas de manejo mais adequado sejam implementadas o quanto antes. “A gente tem que acelerar a implementação das atividades que precisam ser feitas. A gente sabe o que precisa ser feito, mas tem feito em uma velocidade não compatível com o que o mundo precisa. É preciso acelerar e, por isso, irrigar recursos e treinar e capacitar mais gente”, ressaltou Bastos.

O presidente da SRP, Marcelo Janene El-Kadre, disse que a entidade cumpre sua função no momento em que para para ouvir as lideranças do setor com o intuito de buscar formas de lidar com os novos desafios que surgem a todo momento para os produtores rurais. “Aqui estão pessoas de relevância mundial para o setor, para discutir, definir, trazer informações, trocar ideias e ter a ação de executá-las. São pessoas que vivem a realidade do agro e conversando, trocando informações, o resultado não é rápido, mas a gente adianta muito.”

Ciência auxilia produtores a superarem desafios

Em 30 anos, o Brasil passou por uma revolução no campo. De importador de alimentos, o país tornou-se um dos maiores exportadores mundiais. Isso foi possível com o avanço da ciência e da tecnologia no setor do agronegócio e com a disseminação de conhecimento entre os produtores rurais. Agora, com as mudanças climáticas que exigem uma reestruturação do agronegócio brasileiro, novamente as pesquisas científicas entram em cena desempenhando um papel primordial no apontamento de soluções para uma produção mais sustentável que tenha como resultado um alimento de qualidade não apenas nutricional, mas também, ambiental.

“As mudanças climáticas não são um cenário futuro, são um cenário presente. A gente tem que ter mais capacidade de fazer previsões e cenários e, para isso, organizar, sistematizar e disponibilizar bases de dados e informações”, disse a pesquisadora e diretora-executiva de Negócios da Embrapa, Ana Euler, que participou, nesta segunda-feira (16), de uma mesa-redonda no 5º Fórum do Agronegócio, promovido pela SRP (Sociedade Rural do Paraná).

Um dos principais investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), do governo federal, é em um centro de inteligência do agro para que a Embrapa possa ter uma sala de situação capaz de dar respostas rápidas baseadas em 51 anos de pesquisa da empresa. “Estamos investindo em Inteligência Artificial, em Internet das Coisas e, por outro lado, olhando para o pequeno e médio produtor.”

Quando as atenções se voltam para os pequenos e médios, afirmou Euler, a pesquisa deve vir acompanhada de robustas políticas públicas para que esses produtores tenham acesso ao conhecimento científico e às inovações tecnológicas. “É necessário, para além do conhecimento e da pesquisa, a infraestrutura, a conectividade e uma melhor assistência técnica que permite aos pequenos produtores acessarem políticas de crédito. Enfim, é um conjunto.”

Há 51 anos, a Embrapa investiu na adaptação de cultivares temperados a uma situação de solos semi temperados e tropicais. Agora, com os desafios climáticos, quando as palavras mais repetidas são mitigação, adaptação e resiliência, há todo um conhecimento acumulado do qual é possível lançar mão para enfrentar a nova realidade. “Hoje, a gente tem uma base de cultivares, um imenso banco de germoplasma, programas de melhoramento que nos trazem o melhor da diversidade biológica, que é um dos nossos ativos, um dos nossos patrimônios para podermos enfrentar as mudanças climáticas.”

Também é sobre a necessidade de adaptação ao “novo normal” que defende o head de Agronegócio da Climatempo, Caio Souza, participante do evento promovido pela SRP. Durante a ocorrência de eventos climáticos extremos, como chuvas torrenciais ou secas prolongadas, é comum surgirem teorias que antecipam um futuro assustador, mas Souza lembra que as mudanças climáticas exigem adaptações de todos os segmentos do agronegócio para que o setor siga crescendo. “O que nos trouxe até aqui não é o que vai nos levar para um futuro próximo. As mudanças climáticas já são uma realidade. Temos notado invernos cada vez mais curtos, estações chuvosas cada vez menores, e temos que nos adaptar a esse novo normal meteorológico.”

Nesse processo de adaptação, além de procurar por variedades de plantas mais resistentes à seca e às altas temperaturas, os produtores deverão recorrer às informações meteorológicas. “Olhar a previsão do tempo dos próximos três, quatro meses e atuar no planejamento de suas operações agrícolas, seja na escolha de uma variedade de semente, sena na data certa do plantio. Hoje, a meteorologia passa por dentro do planejamento estratégico de todo mundo como forma de mitigar riscos e custos”, apontou Souza.(S.S.)