Quando publiquei o livro "Londrina Puxa o Fio da Memória" (editora Letra D'Água/ 2004) , em parceria com Maria Angèlica Abramo, dedicamos a obra a João Milanez e ao jornalista Edson Vicente - o Jerê - os dois adoravam contar histórias.

No dia do lançamento, na Biblioteca Pública de Londrina, ao ver a dedicatória ao seu João alguém exclamou: "até que enfim!" Fiquei pensando neste tipo de admiração que também é uma espécie de cobrança mesmo diante de um fato consumado: dedicar uma obra a quem achamos que merece a homenagem.

É verdade que, até onde sabíamos, não havia até então um livro dedicado a seu João que cravou o nome da Folha de Londrina na imprensa do Paraná e do Brasil, o que basta para ser merecedor de homenagens.

O "Patrão", como o chamávamos na redação da FOLHA, conversava quase todos os dias com os jornalistas, gostava de fazer piadas, algumas que hoje não passariam na peneira do politicamente correto. Mas, por outro lado, era de uma simpatia e generosidade esfuziantes, seu poder de comunicação, dentro e fora do jornal, contagiava quem conversasse com ele.

Por conta do "até que enfim" na noite do lançamento do livro, também passei a observar que muitas vezes essa expressão pega mal. Enumero algumas situações em que ela chega a ser constrangedora.

- O rapaz tímido arranja uma namorada e o pai exclama: "até que enfim!"

- A prima mais velha diz que vai se casar e os parentes dizem em coro: "até que enfim!"

- A colega de nariz grande avisa que vai fazer uma plástica, as outras comemoram: "até que enfim!"

- O ex-alcoólatra diz que venceu o vício, os amigos de bar respondem: "até que enfim!"

- O concurseiro passa num certame público, depois de bater quinze vezes na trave, a turma celebra: "até que enfim!"

- O desempregado consegue uma vaga e a mulher repete: "até que enfim!"

- O cunhado, sem muitos recursos, leva uma cervejinha ao churrasco da família que o recebe com a frase: "até que enfim!"

- A mulher de 39 anos engravida, depois de se angustiar com tratamentos de fertilidade, as amigas se limitam a dizer "até que enfim!"

- Alguém paga uma dívida depois de sofrer constrangimentos e ouve em casa: "até que enfim!"

Pode ser que as pessoas ao usarem a expressão, que oscila entre o feito e a cobrança, tenham o vício de linguagem de receber conquistas de forma casual e desdenhosa. Mas nunca é demais lembrar que a empatia pode deixar os outros mais confiantes em relação às suas vitórias.

Podemos dizer: "que bom!", "parabéns!"; "você merece!", no lugar de "até que enfim", que não soa exatamente como celebração.

A frase parece a saudação à alguém que estava devendo alguma coisa. Digo isso por atenção às sutilezas da linguagem, percebendo onde se escondem os elogios e as farpas. "Até que enfim" pode ser uma tentativa de elogio, mas também de uma pontinha de crítica ou inveja. É preciso ter cuidado com as palavras.