A necessidade de fantasia tem levado leitores a uma busca maior por livros que remetem a histórias com enredos mágicos como demonstram as preferências nos estandes da 27ª Bienal do Livro de São Paulo que termina neste domingo (15).

Numa seleção feita pelo jornal Estadão, livros que trazem "romantasia', junção de romance com fantasia, estão entre os mais vendidos nesta edição da Bienal. Na lista, figuram títulos como "Era Uma Vez Um Coração Partido", de Stephanie Garber (selo Gutenberg); ou "Powerless", autêntico "romantasia" de Lauren Roberts (editora Rocco).

Um dos autores mais prestigiados no momento também mergulha de corpo inteiro nas histórias do Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda depois de uma pesquisa bem mais consistente. Trata-se de Emanuele Arioli, um italiano de 36 anos, de rosto angelical e olhos azuis que bem poderia ser um dos heróis dessas histórias.

Arioli, autor de "Segurant, O Cavaleiro do Dragão" (que tem várias versões pela editora Autêntica) é um paleógrafo - profissional dedicado a escritos históricos - apaixonado pela Idade Média e que revirou bibliotecas da Europa em busca de fragmentos que constituem a história deste personagem quase esquecido. O primeiro manuscrito sobre Segurant encontrado por Arioli estava incompleto e parava no meio de uma frase, segundo sua entrevista ao Estadão.

A incompletude de um texto instigante fez Arioli percorrer bibliotecas da França, Itália, Grã-Bretanha, Alemanha, Bélgica e Estados Unidos até encontrar 28 manuscritos para formar o livro perdido e ignorado por sete séculos. A obra, que era um best-seller a partir do século 13, havia desaparecido depois que a igreja católica censurou livros considerados profanos. Mas, como na lenda das criaturas mágicas, basta censurar aqui para uma obra reaparecer ali, como um fabuloso dragão de sete cabeças.

O que leva milhares de leitores e autores a histórias fantásticas talvez seja a necessidade cada vez maior de fantasia numa realidade que se dissolve em violências e guerras que parecem anunciar o fim do mundo, tema que também já foi censurado pelas igrejas mas emerge nos bombardeios na Faixa Gaza ou nos ataques entre a Rússia e a Ucrânia, com elementos de surto global movimentando ainda o Irã ou a Coreia do Norte.

O surto, pelo terror da realidade, talvez justifique também as séries baseadas em livros mágicos como "O Senhos dos Anéis" ou a "A Casa do Dragão" que figuram entre as preferências de crianças e adultos afundados no sofá, de olho pregado nas telas, como refugiados do noticiário violento proporcionado pela sanha de líderes mundiais cada vez mais caducos. Esses líderes estão de olho nas "vantagens" da geopolítica, ainda que isso signifique a guerra nuclear e a morte de populações em massa.

Talvez, a necessidade cada vez maior de buscar a fantasia nos livros, séries e filmes seja mesmo a fuga de realidades traumáticas, como ensina a psicanálise. Assim, afunda-se no sofá no lugar do divã.

Não custa lembrar que o mundo, na atualidade, não está muito diferente daquele mostrado nas guerras dos Orcs, as criaturas usadas como soldados pelos vilões nas histórias de J.R.R. Tolkien.

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